segunda-feira, junho 19, 2006

Despedidas e admiraçao

Nos meus 6 anos de Espanha, recebi notícias que me deixaram extremamente triste e com o coraçao murcho. Uma delas foi o falecimento de meu pai.

No ano 2002, minutos depois da vitória do Brasil na Copa do Mundo, recebi o telefonema de um irmao. Pensei que ele me ligava para celebrar a vitória do Brasil. Mas foi um engano meu. Ele me comunicava que o médico de nosso pai havia prognosticado apenas algumas horas de vida para este. Fui ao aeroporto na mesma hora e comprei uma passagem. Voei até Madrid - eu vivia em Bilbao - e liguei para meu irmao. Nosso pai permanecia vivo. Entao, fiz o percurso mais longo, de Madrid a Sampa. Liguei novamente ao chegar em Sampa, e ele se mantinha vivo. Esperei duas horas e peguei um aviao para Porto Alegre. Nesta cidade, liguei outra vez para meu irmao e ele confirmou que nosso pai se resistia na despedida. De Porto Alegre, peguei um ônibus para Santa Maria. Quando cheguei nesta cidade, depois de muitas horas de viagem, meu irmao me esperava com um forte abraço. Nosso pai ainda tinha sinais vitais. Corremos para o hospital. Meu outro irmao, de Recife, já tinha chegado. Ali, ao lado de nosso pai, nos mantivemos por algum tempo. Sua respiraçao parava e voltava a retomar seu ritmo. Houve um momento que pensamos que ele tinha parado de respirar definitivamente, mas ele voltou a realizar o movimento respiratório. Passadas algumas horas, seu estado se normalizou mais. Quando nos preparávamos para deixar o hospital, ele abriu os olhos. Nao sabíamos se nos via ou nao. Intuíamos que sim, pois ele movia os olhos de um filho para o outro. Falávamos com ele, mas ele nao respondia. Passados uns minutos assim, ele balbuciou: "O que vocês estao fazendo aqui?" Rimos com a pergunta e respondemos que estávamos ali para acompanhá-lo. Ele se sentiu tao bem com a nossa companhia, que melhorou instantaneamente. Nao morreu. Nao, naquela época. Ele melhorou, voltou para casa, caminhou, riu, comeu, passeou...Morreu dois anos depois, em casa, quando nao tivemos tempo para acompanhá-lo. Meus irmaos - um do Recife e outro de Brasília - conseguiram chegar em Santa Maria para o enterro. Eu, nao. Junto dele estiveram, também, seus amigos de alma. Seus amigos eram muito importante para ele. Era uma outra família, onde todos comungavam dos mesmos princípios e filosofias. Estes amigos significativos estiveram em sua despedida. Muitos deles também se deslocaram de distintos pontos do Brasil.

Recebi a notícia de madrugada. Uma madrugada fria e chuvosa, aqui. Foi uma surpresa amarga. Passei toda o resto da madrugada ao telefone, falando com meu irmao e com as pessoas que chegavam para ajudá-lo. Enquanto Felipe tomava as providências necessárias, eu acompanhava seus movimentos e sentimentos à distância.

Felipe cuidou exemplarmente de meu pai e de minha mae, falecida há 20 anos. Na saúde e na doença, nunca saiu de perto deles. É possível que, por este motivo, ele tenha sentido mais fortemente a orfandade. Sei lá...sentimentos nao se podem medir. A minha percepçao é que todos ficamos bastante abalados com estas perdas, e que cada um reagiu de acordo com sua individualidade. Mas, sem nenhuma dúvida, o vazio das relaçoes verticais se instalou em nossas vidas de forma definitiva.

Enfim, sentei aqui para escrever sobre a tristeza de receber certas notícias, quando estamos longe. Quando estamos perto, pelo menos podemos expressar mais efetivamente nossa dor e nosso desalento com os fatos, e isso ajuda a cerrar etapas. Na distância, fica o vazio e a angústia.

O que remexeu estas lembranças foi a morte de uma pessoa especial. Ontem, recebi a notícia do falecimento de Dona Josefa. Ela era a mae de uma amiga muito querida. Numa época de minha vida, eu vivi muitas horas na casa desta família. Eram horas felizes. D. Josefa sempre me recebeu com um sorriso enorme e com a bondade estampada em seu rosto. Me tratava como outra filha. Me chamava de Gunga. Ela era daquelas pessoas que têm brilho nos olhos. Nao esqueço de seus olhos e de sua risada.

No momento de seu enterro, quando fechavam o túmulo, o Brasil inteiro explodiu num grito de gooooooool. Era a despedida de uma grande pessoa.

Um abraço e a minha admiraçao, D. Josefa!

6 comentários:

Telejornalismo Fabico disse...

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esse é o grande mistério: sabemos que em algum momento vamos receber uma notícia ruim como essa, mas não temos controle nenhum sobre a reação que teremos.
a marcia fez um post parecido com esse no dia 11.
como sempre, esse grupo de blogueiros anda em sintonia.

fiquei imaginando a agústia que foi a viagem pra rever teu pai.
e que resultou num defecho supreendente.


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Marcia disse...

a decisão de morar longe tem um alto preço.
nos fortalece, mas nos joga em um tipo de desamparo para o qual não existe solução.

as quatro horas mais longas da minha vida foram dentro de um ônibus, indo para santa maria, quando meu irmão já tinha morrido.
ali eu tive certeza que Einstein tinha razão.

adoro teu texto.
fazer este blog foi o teu melhor presente pra nós.

Ana disse...

Que coisa incrível a tua viagem, o teu reencontro com teu pai, vê-lo reagir, voltar pra casa... Fui lendo e me surpreendendo com cada palavra... Que bom que foi assim...

Com relação às perdas, li o seguinte: "O tempo não cura tudo. Aliás, o tempo não cura nada. Só tira o incurável do centro das atenções."

Acho que é assim, mesmo.

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